Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus amigos virtuais sempre têm sido campeões em tudo.
Pelo menos ali no Facebook e no Instagram.
La vie en rose é pouco. Tudo pode
melhorar com o filtro certo. E tome X-Pro II, Amaro, Earlybird, Rise,
Hudson, Sierra, Lo-Fi... Aí sim. O PF vira uma explosão de sabores, gato
vira-lata ganha pedigree, um sorriso amarelo traz de volta a pessoa
amada em três dias, a festinha dá uma animada, aquele moleque fica a
cara do bebê Johnson’s e qualquer domingo no parque é promovido a uma
Coney Island da mente.
E se alguém inventasse uma rede antissocial?
Isso, um cantinho da internet em
que só valeria postar a vida como ela é. Nada a ver com reality show.
Reality show não existe. Ou é realidade ou é show: em 99% do tempo, a
gente faz tudo sempre igual. Difícil é curtir isso. Clica logo esse
botão, sacode a poeira e dá a volta por cima. E as hashtags dessa
distopia digital? Em vez de #fériasincríveis, um sincero #chuvanapraia.
Sai #bomdia e entra #paraquem?, no lugar de #lookdodia aparece a
#loucadodia.
O status traria a opção “Não tenho
certeza”. Trabalho e educação? “Chato” e “ruim”. Residência? “Tô
procurando, o aluguel da última ficou caro.” Idiomas? “Me viro no
português e fiz quatro meses de Aliança em 1989.” E ninguém poderia
escrever que seu livro de cabeceira é russo, seu filme favorito é
tailandês ou que seu defeito é ser perfeccionista.
Sim, demoraria bastante para chegar a 1 bilhão de usuários.
Mas, tudo bem, ninguém precisa
transformar sua timeline num mural das lamentações. Só não faria mal dar
um check-in no mundo real de vez em quando. Nem que seja para lembrar
que o Face é ficção, e que comparar seu dia com o post alheio é
covardia. O inferno não são os outros. O inferno é acreditar que os
outros estão se divertindo mais do que você.
Como lembra a reportagem “Vida
perfeita só existe no Facebook”, citando o inesperado guru 2.0 e
filósofo iluminista Montesquieu: “Se quiséssemos apenas ser felizes,
seria fácil. Mas queremos ser mais felizes do que os outros. O que quase
sempre é difícil, já que pensamos que eles são mais felizes do que
realmente são”.
Aproveita as festas de final de ano para cantar com o Pulp: I eu want to quero live viver like como common people uma pessoa comum.
Fernando Luna, diretor editorial.
Última atualização Pela segunda vez, a Tpm
ganha o Prêmio Esso de Jornalismo, o mais importante da mídia
brasileira. Em 11 anos, foram sete indicações, um recorde entre as
publicações femininas. Agora, a reportagem “Lebmra quem tmoou toads?!”
levou o troféu na categoria Criação Gráfica em Revista – e é claro que a
gente, orgulhosamente, vai postar isso na nossa fan page.